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Ativos, na teoria da contabilidade, são recursos econômicos?

Resolvemos escrever sobre este tema em função dos questionamentos que temos recebido sobre se é correto dizer que ATIVOS são recursos econômicos presentes controlados pela entidade como resultado de eventos passados

Autor: Salézio DagostimFonte: O Autor

Resolvemos escrever sobre este tema em função dos questionamentos que temos recebido sobre se é correto dizer que ATIVOS são recursos econômicos presentes controlados pela entidade como resultado de eventos passados, tal como determina a Resolução 2019 do Conselho Federal de Contabilidade (CFC), NBC TG Estrutura Conceitual, de 21/11/2019, DOU de 13/12/2019.

Um órgão que tem por função editar as normas a ser cumpridas pelos profissionais contábeis tem a responsabilidade aumentada junto à sociedade quando esta norma atinge terceiros. Este órgão não pode simplesmente aprovar uma norma se o que foi escrito (teoria) não puder ser devidamente comprovado na prática. Se a realidade não estiver de acordo com a teoria, é preciso reformular a teoria, já que a sua aplicação não reflete a realidade. A prática é que dá validade à teoria. Portanto, uma teoria só poderá ser considerada válida se puder ser comprovada na prática.

Como teoria e prática necessitam andar juntas, sabendo que a prática é a comprovação da realidade, vamos executar esta Resolução, para verificar se efetivamente estamos diante de um ATIVO. Segundo a teoria citada, ATIVOS são recursos econômicos, e, segundo o que está escrito nesta Resolução, recursos econômicos são direitos que têm o potencial de produzir benefícios econômicos.

No crivo da prática, esta teoria não se sustenta quando procedemos à devida comprovação, porque “recursos econômicos” são os meios materiais ou imateriais usados pelos agentes econômicos e sociais na produção de bens e serviços. Então, para saber se estamos diante de um recurso econômico, basta perguntar se o agente econômico precisa daquele recurso para atingir o seu objetivo, que é a produção de algo. Se a resposta for positiva, estaremos diante de um recurso econômico. Se a resposta, no caso, for negativa, este recurso não é econômico. Como precisamos de mão de obra, de energia elétrica, de água, de máquina, de matéria-prima para produzir algo, podemos afirmar que todos estes elementos farão parte do nosso Ativo. Será mesmo? E se estes recursos econômicos utilizados não forem nossos? Podemos, ainda assim, contabilizá-los em nosso Ativo? E a respeito daqueles bens que não são úteis para a produção, como, por exemplo, um automóvel da administração? Não podemos registrá-los como Ativos? Ora, de acordo com a referida teoria, eu somente poderia registrar como Ativos os recursos econômicos. Fora isso, nenhum outro bem ou direito poderia ser reconhecido como Ativo.

Outro questionamento ainda diz respeito aos “benefícios econômicos”. Segundo as teorias econômicas, benefícios econômicos são os ganhos gerados pelo uso dos recursos na produção de alguma coisa. São os lucros, os superávits, as sobras... Um campo sadio, na exploração econômica da pecuária, traz benefícios econômicos em comparação com a utilização de um campo doente, sem serventia para esta atividade. Assim, de acordo com esta teoria de ATIVO, o campo doente não poderá ser contabilizado como um Ativo nesta organização, já que ele não irá trazer benefícios econômicos. Se os benefícios econômicos são os ganhos pela utilização do recurso econômico, então, de acordo com a teoria, somente poderíamos contabilizar como Ativo um bem (ou direito) caso ele trouxesse benefício econômico. Como vamos saber se determinado recurso econômico irá trazer benefício? Teremos que esperar pelo resultado para saber se devemos ativá-lo ou não? O Superior Tribunal de Justiça (STJ), em 2018, foi chamado a decidir sobre o tema. O profissional disse que iria receber um determinado valor sobre o benefício econômico gerado pelo seu trabalho. No final, o profissional quis receber sobre o montante total recuperado na demanda. O contratante dos serviços disse que “não”, que “benefício econômico”, conforme acordado, não era sobre o montante da demanda, e, sim, sobre a diferença entre o que o fisco dizia que era devido e aquilo que era efetivamente devido. A diferença entre os dois valores seria o benefício econômico. E assim foi a decisão prolatada pelo STJ.

Esta teoria, pelo que constatamos na prática, não se sustenta. Dizer que ativos são recursos econômicos que trazem benefícios econômicos não está correto. Então, como seria a classificação de um campo arrendado, alugado para desenvolver a pecuária, no patrimônio do pecuarista? Ele seria classificado como Ativo, mesmo não sendo dele, já que o campo usado na pecuária é um recurso econômico. Será mesmo que podemos ativar o campo, ainda que não seja dele, mas alugado? Outra questão: Esta mesma pessoa jurídica tem uma área de terra geograficamente impossível de ser explorada na pecuária. Do ponto de vista econômico, é inviável a sua exploração. Ela foi adquirida simplesmente para fins especulativos. Então, sobre esta terra, que não serve para desenvolver fins econômicos e que só gera despesas com a sua manutenção, será que podemos ignorar a sua contabilização (registro) no patrimônio deste pecuarista?

Esta teoria não está correta, precisando urgentemente retornar ao conceito anterior. A teoria anterior sobre Ativo, aprovada em Congresso Brasileiro de Contabilidade e ratificada pelo próprio CFC, dizia que Ativo era um conjunto de “bens e direitos”. Dizia, também, que para se classificar alguma coisa como “bens e direitos”, ela precisa ter liquidez, ou seja, ser passível de se transformar em dinheiro, podendo ser objeto de troca ou gerar fluxo de caixa com a sua realização, a sua venda ou a sua transferência a terceiros.

Este tema, inclusive, foi objeto de uma pesquisa, que serviu de base para uma tese de mestrado, em que o autor perguntou aos contadores qual seria a melhor definição para Ativo. 99% dos participantes disseram que a melhor definição para Ativo seria a de “bens e direitos possuídos por uma entidade”. Portanto, conclui-se que a teoria adotada pelo Conselho Federal de Contabilidade não está correta, necessitando urgentemente de alteração.

Salézio Dagostim é contador; pesquisador contábil; professor da Escola Brasileira de Contabilidade (EBRACON); autor de livros de contabilidade; fundador e ex-presidente do Sindicato dos Contadores do Estado do Rio Grande do Sul e da APROCON CONTÁBIL-RS; presidente de honra da Confederação dos Profissionais Contábeis do Brasil - APROCON BRASIL, e sócio do escritório contábil estabelecido em Porto Alegre (RS), Dagostim Contadores Associados, à Rua Dr. Barros Cassal, 33, 11º andar. E-mail para contato: [email protected].